quarta-feira, 27 de outubro de 2010

França - O Outono Frio Começa a Esquentar



Apesar do clima frio, e da falta crescente de gasolina, o movimento social está esquentando, alimentado por diversão, fogo e fúria. “Operações Tartaruga”, greves, mini-insurreições, bloqueios de escolas, Assembléias Gerais, ocupações, e hoje a quarta Greve “Geral” de 24 horas desde sete de Setembro... mas onde tudo isso está indo? Quais contradições não estão sendo confrontadas? Continue lendo...

Motoristas de caminhão se juntaram ao movimento ontem, com o objetivo explícito de “bloquear a economia”. “Operações Tartaruga” (andar devagar nas principais estradas e rodovias) em volta de Lille, Toulouse, Lyon, Bordeaux, sul de Paris, Tours, Frontignan, Arras, várias partes da Normadia e muitos outros lugares – oficialmente houve mais de 30 “tartarugadas” em 15 cidades diferentes ontem (Outubro 18). Isso, no dia anterior à chamada Greve “Geral” convocada para hoje, Terça Feira (19 de outubro). “Geral” entre aspas porque claramente muitas pessoas continuaram trabalhando nos setores que oficialmente entraram em greve. Algumas das “operações” duraram apenas 20 minutos, mas outras continuaram por várias horas. Some of these 'go-slows' lasted only 20 minutes, but others for several hours. Operações tartaruga para carros regulares só aconteceram na pista de alta velocidade, porque caminhões grandes não são permitidos nelas.
Vários depósitos de petróleo foram bloqueados. Apesar das afirmações do governo no Domingo de que apenas 200 estações de petróleo foram fechadas, a organização responsável por produzir estatísticas sobre as estações disse ontem – Segunda-feira – que 1500 estão fechadas; e a quantidade de postos de gasolina em que se esgotou a gasolina deve ter sido muito maior que isso. Essa deficiência é devida tanto às greves e bloqueios das refinarias quanto à greve dos estivadores, que deixou pelo menos 60 petroleiros presos no Mediterrâneo, sem poder embarcar.

Liceus (colégios de ensino médio) continuam a ser bloqueados (oficialmente – de acordo com o Ministro da Deseducação – 260, mas 600 de acordo com a UNL – União Nacional dos Estudantes de Liceu)

Houve pequenas rebeliões e confrontamentos com a CRS (polícia de choque contra manifestações) em pelo menos cinco cidades – em Nanterre, Lyon, Lille, Mulhouse e Borges. Os chamados “casseurs” (literalmente “quebradores”: veja esse texto de 1994 em Inglês: http://libcom.org/library/1994-nous-sommes-tous-des-casseurs)
In Marseille os lixeiros estão greve faz mais de uma semana (juntando-se aos estivadores e trabalhadores de refinarias). O lixo está transtornando os turistas, que estão ansiosos para consumir as novas áreas gentrificadas, introduzidas por artistas e pela construção de uma nova trilha de bonde, livre do fedor de proletários revoltados. O prefeito também está contrariado. Marseille já está se preparando para o ano em que vai se tornar a Capital Cultural da Europa em 2013. Com a Ryanair retirando a sua linha aérea de lá, dando ao termo “vôo de capital” um sentido quase literal, o projeto de trazer os clientes das quatro pontas do globo pode muito bem ter sido arruinado. Toda aquela regeneração gloriosa com uma superfície limpinha, desenhada para reduzir todo senso de passado em uma foto turística, foi destruída pela subversão radical. Como um lixeiro disse, “Somos o proletariado, não podemos só sentar e girar nossos polegares.” Apesar disso possivelmente vir de um membro do velho estilo do Partido Comunista, na atmosfera da ideologia Republicana em que todo mundo é encorajado a se definir como um “cidadão” se trata de um lembrete refrescante da verdade social antagonística básica. Uma jovem de 16 anos de Marseille, Sarah Jlassi, acrescentou que “Isso já foi além das pensões, se trata da nossa sociedade injusta e dividida.” Apesar disso certamente não estar no centro do movimento, jovens na mídia e na rua, de todas as origens, estão constantemente dizendo o quanto seus pais estão estressados depois do trabalho, e o quanto eles não conseguem se comunicar com eles por isso.

Alguns anos atrás, o prefeito trouxe o exército para limpar o lixo. Se ele vai fazer isso de novo no atual clima bem mais generalizado de guerra de classes, não se sabe, mas ele poderia acabar encontrando uma frustração bem maior que a Ryanair brincando de ser difícil. E isso com certeza a longo prazo – a chamada “cena radical” vem se organizando a muito tempo contra a gentrificação e o lixo cultural que vai encher as ruas em pouco mais de dois anos (uma tradução desse texto sobre arte e gentrificação vem se tornado muito popular nos últimos 18 meses)
Em Languedoc-Roussilon, onde eu vivo:

Em Nimes (no estado de Gard), todos os lycees estão fechados, e houve sit-ins na prefeitura.
Ales (também em Gard), um bloqueio das linhas de trem, com fogo pra manter as coisas quentes.

Bombeiros entraram em greve por toda a Gard, respondendo apenas aos chamados mais urgentes.
Em Pepignan, 150 grevistas bloquearam um depósito de petróleo por quatro horas, com pneus queimando por toda a estrada. Um motorista de trem apoiando o bloqueio disse na televisão, “Isso não é sobre a aposentadoria, mas sobre todo o futuro dessa sociedade”, embora existam tantos modos de entender as implicações disso quanto pessoas que se sentem da mesma forma. 200 professores ocuparam uma instituição estatal local (não sei bem qual). Um carro de bombeiro foi atacado com pedras.

Em frontignan, perto de Sete, 300 motoristas de trem e de caminhão, além de outros, bloquearam um depósito de gasolina, começando muito cedo na madrugada – interrompendo a distribuição em três municípios. Um motorista de trem disse que “Estamos fazendo isso pelo futuro – pelos nossos netos”, apesar deles também estarem claramente fazendo aquilo por eles mesmos. Os policiais, precedidos por um prefeito muito razoável e gentil pedindo uma dispersão calma, desbloquearam o depósito no meio da tarde sem resistência – 300 pessoas, num lugar relativamente isolado, não sendo suficientes contra policiais armadas com spray de pimenta e bombas de efeito moral.

No entanto, a expulsão foi imediatamente seguida por uma mini-Greve Geral na área de Frontignan. Aude também teve o bloqueio de um depósito de óleo até o meio da tarde.

Em Montpellier o “concierge” (escritório de segurança e vigilância) de um lycee foi completamente destruído por fogo. E muitas das janelas desse lycee foram “quebradas” (são janelas muito grossas da alta segurança, então nenhuma delas despedaçou) por mais ou menos 50 jovens encapuzados Um professor, que possivelmente discordou desse ataque razoável, teve um molotov jogado em sua direção, que não a alcançou ou feriu de forma alguma. Ela os chamou de terroristas. A escola foi evacuada.

Na sexta feira 15 de outubro, mais ou menos 60 jovens atacaram o bloqueio de um liceu de alto nível em Montepplier (“Joffre”) – policiais do BAC (brigada anticrime) e suspeitos de serem do RG (equivalente do Serviço Especial) foram vistos em seus carros do lado de fora, saindo apenas um minuto antes da multidão de jovens chegarem. Esses jovens também atacar estudantes “universitários” (estudantes de 12 a 15 anos), e depois atacaram outra escola ali perto, dessa vez passando pelos dormitórios roubando o que podiam. Um carro com um casal dentro foi virado fora dessa escola, e aparentemente um motorista de bonde foi esfaqueado na mão. Um radialista disse a uma adolescente que ele estava entrevistando que ele teve informação por dentro de que eles haviam sido manipulados pela polícia, só que ele nunca divulgou nada disso (provavelmente por medo de perder o seu emprego). Claramente, no entanto, as degradações da vida nos subúrbios e a mentalidade de gangue que a sobrevivência engendra significam que alguns jovens não precisam ser manipulados – eles vêem tudo em termos de um mundo em que um cachorro come outro cachorro, e vai ser necessário um risco considerável de um diálogo entre aqueles jovens que se identificam com e participam de um movimento social geral e aqueles mais niilistas só que sem direção (ou objetivos) para mudar isso em vantagem para ambos. Certamente apontar dedos de forma moralista é a última coisa que vai influenciar qualquer mudança nessa área: esse tipo de gesto faz parte do mundo que eles estão certos em desprezar, mas não podem ver ou lutar contra ou realmente achar qualquer caminho para for a dele. E a situação não é melhorada pelas condenações generalizantes de qualquer coisa que envolva violência como coisa de “casseurs (quebradores) que não tem nada a ver com o movimento”. A imprensa local estava cheia de condenação por esses atos (apesar de alguns dos piores, surpreendentemente, não terem sido noticiados), mas quando o diretor do Lycee Joffre bateu o portão na mão de uma estudante participante do bloqueio e quebrou o seu pulso, isso foi considerado um “acidente”. Em outra escola na cidade, um professor anti-bloqueio que estava dentro do prédio empurrou uma barreira construída pelos estudantes de volta na calçada, quase machucando seriamente os rostos de alguns jovens. Um pai que educadamente avisou o professor dos perigos do que ele estava fazendo levou um soco na cara logo depois pelo mesmo professor. Mas críticas em bloco dos “casseurs” são um meio conveniente de ignorar essas contradições, e de não olhar para o que é bom e justificável e o que é doentio/equivocado nas ações dos “casseurs”.


Jovens do ensino médio cantaram essa semana: “No parlamento os Primeiros Ministros batem punheta o dia inteiro” (isso rima em francês e eles cantam).

Mais poderia ser dito, e eu não fui sequer capaz de desenvolver as respostas às questões colocadas na introdução, mas eu tenho que ir agora. Desculpas pelo atraso e insuficiência disso: problemas com a internet, com o computador e pessoais causaram o atraso...

Samotnaf
19 de Outubro de 2010
 Traduzido por L.M. Em 27 de Outubro de 2010

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