quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Em volta do fogo, dançamos (Parte 1)

“Pensa na escuridão e no grande frio 
Que reinam nesse vale, onde soam lamentos.”
 

Brecht, Ópera dos três vinténs

Mas o que é a escrita? A escrita é a guardiã da história... meio de acesso em urgência à memória coletiva...

E o que é o homem? Um escravo da morte, um viajante en passant, um visitante na terra...

O que é amizade? A igualdade entre amigos... a irmandade entre iguais, um projeto em comum, ainda que passageiro.

O nosso projeto era tentar emular, em uma micro-sociedade que seja, um núcleo de relações que fosse absolutamente antitético ao atual estado de coisas. Uma nova orientação, um espaço livre, por assim dizer. "A vida é curta, amigos, e se vivemos..."

E dessa maneira nós nos alistamos (i)rrevogavelmente no partido do Diabo -- o "mal histórico" que leva as condições existentes à sua destruição, o "lado mau" que faz história ao sabotar toda a satisfação estabelecida.

Não há momento mais lindo do que aquele em que um ataque contra toda uma ordem mundial é lançado desde uma clareira verdejante e isolada.

Desde o seu começo mais imperceptível você já sabe que, aconteça o que acontecer, muito em breve nada mais será como antes. Aquela vertigem de encarar o abismo ou o escuro da madrugada ou um  amor. A vertigem, aquele não saber o que fazer -- os sinais de que algo realmente importante começou a acontecer.

Num jogo de cartas marcadas, só restava mudar as regras pra poder vencer.

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segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Infância

"Havia muita coisa interessante em casa, muita coisa engraçada, mas às vezes uma tristeza irresistível me sufocava, como se algo opressivo me enchesse todo, e durante muito tempo eu tinha a impressão de viver em um fosso escuro e fundo, sem visão, sem audição e sem nenhum outro sentido, cego e semimorto..."

Máximo o Amargo

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sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Guerra da rua, guerra da alma

"Quantas vezes fui um ditador? Quantas vezes um inquisidor, um censor, um carcereiro? Quantas vezes proibi, aos que mais queria, a liberdade e a palavra? De quantas pessoas me senti dono? Quantas condenei pelo delito de não serem eu? Não é a propriedade privada das pessoas mais repugnante que a propriedade das coisas? A quanta gente usei, eu que me acreditava tão à margem da sociedade de consumo? Não desejei ou celebrei, secretamente, a derrota dos outros, eu que em voz alta me cagava no valor do êxito? Quem não reproduz, dentro de si, o mundo que o gera? Quem está a salvo de confundir seu irmão com um rival, e a mulher que ama com a própria sombra?"

Eduardo Galeano, em Dias e Noites de Amor e de Guerra.

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sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Não só.


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domingo, 2 de outubro de 2011

Assim sendo...

Por enquanto, aguentamos.

Pois ninguém faz revolução obrigado.

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quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Comigo me desavim (sá de miranda, 1485-1558)

Comigo me desavim,
Sou posto em todo perigo;
Não posso viver comigo
Nem posso fugir de mim.

Com dor da gente fugia,
Antes que esta assi crecesse:
Agora já fugiria
De mim , se de mim pudesse.

Que meo espero ou que fim
Do vão trabalho que sigo,
Pois que trago a mim comigo
Tamanho imigo de mim?


relembrando a profa e poetisa muy querida .

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quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Cenas roubadas


(Desviando de um esbarrão) 

- Desculpe.

- Desculpe.
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.(ela se volta e segura o meu ombro)

- Ei, ei, espera aí... será que podemos começar de novo? Sei que não nos conhecemos mas... eu não quero ser uma formiga. Passamos pela vida esbarrando uns nos outros, sempre no piloto automático, como formigas... Não somos solicitados a fazer nada de verdadeiramente humano:
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“Pare”, “Siga”, “Ande aqui”, “Dirija ali”.
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Ações voltadas apenas pra sobrevivência. Toda comunicação servindo exclusivamente para manter ativa a colônia de formigas de um modo eficiente e civilizado:
(com um muxoxo lindo)
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"Aqui o seu troco, senhor."
"Papel ou plástico?"
"Crédito ou débito?"
"Aceita ketchup?"
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Não, eu não quero quero um canudo. Quero momentos humanos verdadeiros. Quero ver você. Quero que você me veja. Não quero abrir mão disso. Não quero ser uma formiga, entende?

- Entendo... mas....

(Na vida real, a moça segue e eu também. Haha, só num filme mesmo. Chega o trem. 10:15, pontual como sempre. Ufa! Sinto algo formigando... )

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quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Confissão

Não fiz nada.


O que se pode fazer?

Por favor, perdoe.

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sábado, 14 de maio de 2011

Relembrar não é viver

Um prelúdio e um retorno. Já dizia um velho camarada: nada possui tanto valor que não deva ser recomeçado, nada possui tanta riqueza que não precise ser enriquecido. Vamos ver se adianta.

Uma Vida Não é Suficiente Para Desaprender
Por Face Inoculta

Fingir. Como em cada começo do ano. Como se esse ano não fosse ser a mesma repetição do ano anterior. Como se tudo fosse se passar melhor: eu vou estudar mais, os professores serão menos idiotas, minha vida terá um pouco mais de sentido.
Minha vida, como se ela me pertencesse. E o futuro que o esperamos. E, depois, há aquele sentimento estranho: mas o que é que eu estou fazendo aqui?
Ah, eu não sei direito. Disseram-me que eu deveria ir à escola, um dia, e desde então eu vou todos os dias. Logo, virou normal. E a questão continua sem resposta... a única coisa clara, em todo caso, é fazer aquilo que esperam de mim. E nesses momentos de fraqueza, de desespero, nesses momentos nos quais eu não posso mais, o único refúgio que me resta é não mais pensar e obedecer. Fazer o que minha agenda manda, e isso pode fazer bem. Um bem assombrosamente vazio, um conforto incrivelmente oco, uma felicidade infinitamente triste, nos quais, lá dentro, eu me detesto. Eu me detesto ao ver os outros, os adultos, tão satisfeitos e seguros de me verem abandonado a suas esperas. Eu me detesto ao ver os outros, meu amigos, preferirem-me quando eu me adapto aos seus olhares. Eu me detesto ao não conseguir fazer com que eles gostem da minha imagem, e eu me detesto ao gostar de mim quando eu consigo. Eu me detesto ao voltar sempre a isso aqui, quando eu gostaria de estar em outro lugar.
Na verdade, eu me detesto ao me ver viver, e de ter consciência. Eu tenho essa impressão estranha que tudo que eu poderia viver já passou. Em outro lugar. Na televisão por exemplo. Que a escola, a vida inteira, é um clipe da MTV onde eu estou sempre procurando saber como aparecer bem, tentando encontrar o melhor ângulo pras câmeras, pros espelhos, olhando-me atuar na minha própria vida.
Fingir. Como em cada começo do ano. Fazer como se... Eu não posso mais. Aflição por não saber porque eu choro, aflição por não conseguir gritar, aflição por não estar nunca aflito. Nós estamos mortos num mundo que nem nascemos, mortos por não poder habitar um mundo que é só concreto e vitrines, mortos por sermos apenas imagens. Eu não serei mais uma vitrine: eu me quebro para começar a viver. Isso é o início. Se você quebra a sua, NÓS poderemos quebrar outras. Tirar o clipe da MTV de nossas vidas destruindo seu cenário. Desertar, é tornar deserto um lugar que esperam que cheguemos, nossos professores, nossos pais, a polícia, nossos namorados, e antes de tudo, nós mesmos. A dois nós seríamos fortes, e NÓS somos mais que dois. NÓS somos mais numerosos a cada dia, e o concreto, reflexo da nossa miséria, treme para desaparecer. Existem encontros a serem feitos, amizades para se encontrar. Nós temos quase todos um grupo de amigos com quem passamos o tempo, fumamos um, vamos à praia, vemos um filme, saímos a noite... Um grupo para dividir tristes paixões. Um grupo que nos assegura, que nos deixa sozinhos juntos, que nos diverte. Eu estou perdido para me encontrar, aqui onde o que procuramos está em outro lugar.
Na escola eu me sinto como um rato na gaiola. Uma gaiola com suas regras, seus hábitos, suas punições. Seus códigos, seus comportamentos, suas atitudes que sem parar nos contêm. Ou quase. Eu sinto as vezes como faíscas, faíscas de luz no escurecer do nosso cotidiano. Uma solidariedade no roubo, na conspiração, no silêncio que segue uma incitação à denúncia. Que toda a classe se une pra resistir de qualquer forma a um professor quando ele é autoritário, e uma nova felicidade se instala entre nós. Uma exaltação. Falamos sobre isso o dia todo, durante semanas! Se só isso pudesse ser sempre assim... mas é difícil. É difícil prolongar esses momentos de resistência face aos professores que nos ameaçam, que nos reprovam. Tínhamos feito o certo. É difícil porque mesmo nos momentos intensos, nós somos sempre pegos pela nossa solidão para nos assombrar desde que isso acabe.
Quando um professor nos ameaça de não dar aula até que seja denunciado o responsável por alguma infração, é extremamente engraçado ver que ele não pode fazer nada desde que não digamos nada, que ele fica completamente perdido quando continuamos calados. Infelizmente, quase sempre tem um que solta, que colabora. Nós aprendemos. Quase sempre os mesmos, mas as vezes temos surpresas, traições. Isso não pode nunca acontecer. Não mais traidores! Nós deveríamos lhes dar o que merecem, socos no estômago. A fim de que eles aprendam que não são mais do que um professor, ou mesmo um policial. Que eles compreendessem que é por conta de gente como eles que vivemos numa “sociedade de merda”, na qual ninguém liga pros outros se cada um tiver seu dinheiro, sua casa, seu carro zero.
Dizem-me frequentemente que se eu não estou contente eu posso mudar eu mesmo. Porque “minha liberdade começa onde acaba a liberdade do outro”, eu não devo querer mudar nada mais. Eu tentei e isso não funciona. Eu acabei percebendo por que: eliminar a parte de si que detestamos é também destruir tudo aquilo que a alimenta. O mundo da mentira. A ilusão de liberdade. Eu prefiro pensar que minha liberdade começa onde começa a dos outros, e que esse estúpido provérbio só existe para nos lembrar de não “mexer” com ninguém, de “respeitar” o indivíduo, que assim tudo continua no seu lugar.
Não nos incomodemos.
Aqui me volta a cabeça Maio de 68, que eles já tentaram, que nós não podemos mudar mais nada. Que foi só um episódio legal. Mas eu elaborei minha própria ideia; Maio de 68 são milhares de pedras voando contra a polícia, milhares de vitrines quebradas, de barricadas, de carros queimando, de usinas pegando fogo, de amor, a felicidade da revolta. A felicidade de destruir isso que nos apodrece a vida, de se amar mais intensamente e criar espaço a outros mundos. E depois, percebo que nosso curso da história negligenciou um fato essencial: Maios de 68, houve milhares.
Então querem que eu me cuide, porque sou EU que não vou bem, porque os gritos levam ao prisão e as pedras à prisão. Querem que façamos como se fôssemos nós a causa da doença, como se não estivéssemos cercados de desolação. A psiquiatria, toda forma de espiritualidade individual, de organização de caridade, as ONG's, o NPA* e o comércio solidário estão aqui para nos vender a boa consciência, para nos vender a esperança de uma reconciliação. Eu não cairei mais na armadilha desta falácia, onde cada nova imagem da felicidade é a confissão da mentira da imagem anterior.
Eu me sinto mal ao ver meus pais quererem meu bem repetindo só o que esse mundo quer para ele mesmo. É agora que estou triste, e desde sempre, mas eles continuam a falar de uma felicidade que está a vir, a me dizer que encontrarei meu caminho aqui onde tudo parece estar fechado, que foi só um passo mal dado. “Vai dar tudo certo.” Mas parece que o passo mal dado não passa, e que o futuro que eles me falam sempre estará a vir. Se estamos na escola nos falam sem parar de universidade; na universidade nos falam sobre trabalho; no trabalho nos falam da aposentadoria, e depois da aposentadoria preparamos uma morte tranquila que começou desde a escola. Nos ensinam a viver o futuro simples. “O ano que vem você será...”, “daqui a pouco eu serei...” Nossos pais, tristes crianças de suas épocas, não sabem, a maioria, que nos ensinam a sobreviver da melhor maneira que seja. A sobreviver de uma melhor maneira que eles fizeram. Minimizar ao melhor as olheiras, o álcool, os antidepressivos. Ganhar suficientemente dinheiro, ter um bom status, reiterando ao mesmo tempo cinicamente que “o dinheiro não faz a felicidade”. A felicidade, está a nós para descobrimos, na nossa vida dita “privada”, nessa preocupação paliativa que é a construção de si mesmo.
Olhe nossos pais; eles são felizes? Eles são verdadeiramente felizes? Eles não parecem mais carregar um peso – visível nas olheiras – de ter sacrificado a vida a uma certa ordem das coisas? Os venderam essa mesma mentira que querem nos vender hoje com muito mais histeria, histeria que só faz desmascarar essa ilusão:
“Sua vida consistirá em engessar um muro que está desmoronando, mas como se você não soubesse.”
E nós replicamos:
“Nós não queremos suas olheiras, nem mais o seu gesso e suas mentiras. Não, nós não queremos parecer verdadeiramente felizes. Nós largamos nossos trilhos. Nós temos a intuição de que isso que esconde esse muro que já cai em migalhas, acabará em cinzas. Um amigo disse que a característica destrutiva demole o que existe não por amor as ruínas, mas pelo amor dos caminhos que as atravessam.
Nós acreditamos, e nossa força cresce a cada dia.”

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segunda-feira, 28 de março de 2011

Sinais de derrota da revolução Líbia

Declaração contra a exclusão aérea por um anarquista líbio
The signs of the defeat of Libyan revolution
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Em algumas horas, o Conselho de Segurança da ONU vai determinar o início da exclusão aérea contra a Líbia. A França disse que está preparada para começar o bombardeio a partir de hoje à noite.
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Condenamos essa resolução internacional, se ela for realizada. E rejeitamos totalmente qualquer intervenção estrangeira na Líbia, seja qual for a forma que tome, especialmente uma intervenção francesa. A França, que vendeu a Qadafi armas no valor de bilhões, armas que hoje ele está usando para explodir Líbios, a mesma França que não interrompeu essas vendas até 3 semanas atrás.
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Condenamos essa intervenção que vai transformar a Líbia em um verdadeiro inferno, ainda mais do que é agora. Essa intervenção também vai roubar a revolução dos Líbios, uma revolução que já lhes custou milhares de homens e mulheres mortos até agora.
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Uma intervenção que também vai dividir a resistência Líbia..
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E mesmo se essas operações tiverem sucesso e Qadafi caia (ou morra) como Saddam Hussein, isso vai significar que fomos libertados por americanos e franceses, e eu posso garantir que eles vão ficar nos “relembrando” disso a cada minuto.
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Como poderemos tolerar isso depois? Como vamos explicar todas essas mortes às gerações futuras, todos os cadáveres que estarão em todo lugar?
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Para sermos libertados de Qadafi apenas para virarmos escravos daqueles que lhe deram armas e poder durante todos esses anos de violência autoritária e repressão?
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Após o primeiro erro – a militarização de uma revolução popular – estamos cometendo agora o nosso segundo erro – o estabelecimento de novas figuras de líderança surgindo dos remanescentes do regime Jamahiriya líbio. E nosso terceiro erro, que vai acontecer inevitavelmente, é o de pedir ajuda aos nossos inimigos. Eu apenas espero que não cheguemos ao quarto: quer dizer, a ocupação e a chegada dos marines.
Sarkozy e a França são nossos inimigos; eles também são inimigos de todo o Terceiro Mundo. Eles não escondem o desprezo que sentem por nós. Sarkozy apenas quer ser reeleito no ano que vem.
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O homem que organizou o encontro entre Sarkozy e os representantes do conselho nacional interino é nada menos do que Bernard-Henri Lévy, um filósofo charlatão, e para todos que não o conhecem, um ativista sionista francês que concentra todos os seus esforços em apóiar Israel e seus interesses. Nós o vimos na Praça de Tahrir apenas para garantir que a juventude revoltada não entoasse cantos contra Israel.
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O que pode ser dito enquanto esperamos pelas bombas?
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Porque as bombas não vão diferenciar entre aqueles que são pró-Qadafi e aqueles que são contra.
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Bombas colonialistas, como se sabe, tem apenas um objetivo: defender os interesses da indústria bélica. Eles venderam a Qadafi armas no valor de bilhões e agora nós lhes pedimos para destruí-las…e aí nós teremos que comprar novas armas pelo novo governo – trata-se de uma velha, bem conhecida história. Mas existem pessoas que não conseguem aprender a não ser repetindo velhos erros, cometidos tanto tempo atrás.
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Eu digo isso claramente: esse é um erro estratégico muito grande, e um erro que o povo líbio vai pagar com juros por, talvez, vários anos agora. Mais do que os anos de ditadura de Qadafi e sua família.
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Eu chamo hoje, e agora, algumas horas antes da destruição da Líbia e antes que ela se torne outra Bagdá, eu chamo todos os Líbios, todos os intelectuais, artistas, estudantes, todos, aqueles que sabem escrever e os que não sabem, todo homem e toda mulher, a rejeitar essa intervenção militar pelo USA, França e Inglaterra, e a repudiar os regimes no Oriente Médio que eles apóiam. Ao mesmo tempo, convoco todos que nos apóiam, os egípcios, tunisianos, franceses e mesmo chineses, todos os povos do mundo, nós pedimos por seu apoio e simpatia.
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Mas quanto a governos, seja qual for o governo, não pediremos nada além de nos deixarem em paz, de nos deixarem resolver o problema de Qadafi nós mesmos.
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Saoud Salem
Anarquista Líbio
17 Março de 2011
Tradução: L.M.

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sexta-feira, 25 de março de 2011

Dez Punhaladas na Política

A política é a arte da separação. Onde a vida perdeu a sua plenitude, onde os pensamentos e as acções dos indivíduos foram dissecados, catalogados e encerrados em esferas separadas – aí começa a política. Tendo afastado algumas das actividades dos indivíduos (a discussão, o conflito, a decisão em comum, o acordo) para uma zona que por si mesma pretende governar certa da sua independência — todas as outras, a política é ao mesmo tempo uma separação entre separações e a administração hierárquica da existência de separações. Deste modo, a política revela-se como uma especialização, forçada a transformar o problema irresolvido da sua função num pressuposto necessário para resolver todos os problemas. Exactamente por esta razão, o papel dos profissionais na política é inquestionável — e tudo o que se pode fazer é substituí-los de tempos a tempos. De cada vez que os subversivos aceitam separar os vários momentos da vida e mudar — partindo dessa separação— as condições existentes, eles tornam-se os melhores aliados da ordem do mundo. Precisamente quando aspira a ser uma espécie de condição prévia da própria vida, a política espalha o seu hálito mortífero por toda a parte.

A política é a arte da representação. Para governar as mutilações infligidas à vida, a política constrange os indivíduos à passividade, à contemplação do espectáculo montado a partir da própria impossibilidade de agir, a partir da delegação irresponsável das próprias decisões. Então, enquanto a abdicação da vontade de se determinar a si mesmo transforma os indivíduos em apêndices da máquina estatal, a política recompõem numa falsa unidade a totalidade dos fragmentos. O poder e a ideologia celebram desta maneira o seu funesto casamento.   Se a representação é o que tolhe a capacidade de agir dos indivíduos, dando-lhes em contrapartida a ilusão de serem participantes e não espectadores, esta dimensão do  político reaparece sempre onde quer que qualquer organização suplanta o indivíduo e onde qualquer programa os mantém na passividade. Reaparece sempre lá onde uma ideologia une o que na vida é separado.

A política é a arte da mediação. Entre a pretensa totalidade e os indivíduos, e dos indivíduos entre si. Tal como a vontade divina tem necessidade dos seus próprios intérpretes terrestres, assim também a Colectividade tem necessidade dos seus próprios delegados. Tal como na religião não existe relacionamento entre homens mas apenas entre crentes, assim também na política quem se defronta não são os indivíduos mas sim os cidadãos. Os laços de pertença impedem a união porque só na diferença a separação desaparece. A política torna-nos a todos iguais porque na escravidão não existe diversidade — igualdade perante Deus, igualdade perante a lei. Por isso, a política substitui o diálogo real, que recusa a mediação, pela sua ideologia. O racismo é o sentimento de pertença que impede a relação directa entre os indivíduos. Toda a política é uma simulação participativa. Toda a política é racista. Apenas demolindo pela revolta as barreiras de cada um se pode encontrar os outros na sua singularidade. Revolto-me logo somos. Mas se nós somos, adeus revolta.

A política é a arte da impessoalidade. Cada acção é como o instante de uma centelha que escapa da ordem da generalidade. A política é a administração desta ordem. “Que valor tem uma acção face à complexidade do mundo?” Assim argumentam os anestesiados no torpor duplo de um Si[1] que é ninguém e de um Mais tarde que é nunca. A burocracia, criada fiel da política, é o nada administrado para que Ninguém possa agir. Para que ninguém reconheça a sua responsabilidade na irresponsabilidade generalizada. O poder já não diz que tudo está sob controlo, diz pelo contrário: Se nem eu dou conta do recado, imagine-se outro qualquer no meu lugar “. A política democrática está hoje em dia baseada na ideologia catastrófica da emergência (” Ou nós ou o fascismo, ou nós ou o terrorismo, ou nós ou o desconhecido”). A generalidade, mesmo a de oposição, é sempre um acontecimento que não acontece nunca e que apaga todos aqueles que acontecem. A política convida toda gente a participar no espectáculo deste movimento imóvel.

A política é a arte do adiamento. O seu tempo é o futuro, e é por isso que nos aprisiona a todos num presente miserável. Todos juntos, porém amanhã. Aquele que diz ” eu e agora!” arruína, com aquela impaciência que é a exuberância do desejo, a ordem da espera. Espera por um objectivo que escapa da maldição do particular. Espera por um crescimento quantitativo adequado. Espera por resultados mensuráveis. Espera pela morte. A política é a constante tentativa de transformar a aventura em futuro. Mas só se for “eu e agora” quem decide, pode haver um nós que não seja o espaço da renúncia mútua, a mentira que torna cada um no controlador do outro. Aquele que queira agir imediatamente é sempre olhado com suspeição. Se não é um provocador, diz-se, com certeza faz-lhe o jogo. Mas é o instante de uma acção e de um prazer sem amanhã o que nos transporta para a manhã seguinte. Sem os olhos fixos nos ponteiros do relógio.

A política é a arte da acomodação. Sempre à espera de que as condições estejam maduras, acaba-se mais cedo ou mais tarde a formar alianças com os senhores da espera. No fundo, a razão, que é o órgão da dilação e do adiamento, fornece sempre algum bom motivo para se chegar a um acordo, para se minimizar os danos, para se salvar algum detalhe de um todo que se despreza. A razão política tem um olhar aguçado para encontrar alianças. Não são todos iguais, diz. A Rifondazione Comunista não é, com certeza, como essa direita em ascensão e perigosa. (Nas eleições não votamos neles
nós somos abstencionistas — já colaboração em comités cidadãos, em acções de rua, é diferente). Um sistema de saúde público é sempre preferível à assistência privada. Um salário mínimo garantido é sempre preferível ao desemprego. A política é o mundo do mal menor. E submeter-se ao mal menor leva a aceitar, pouco a pouco, o todo do qual apenas se tinha dado preferência a uma parte. Qualquer um que, pelo contrário, não quer nada com este mal menor é um aventureiro. Ou um aristocrata.


A política é a arte do cálculo. Para que as alianças sejam profícuas, os aliados precisam de conhecer os segredos. O cálculo político é o primeiro segredo. É necessário saber onde se põem os pés. É necessário redigir listas detalhadas de esforços e resultados. E à força de se medir tudo o que se tem acaba-se por se ganhar tudo excepto a vontade de se jogar tudo e de se perder tudo. Assim está-se sempre em si, atento e pronto a pedir a conta. Com o olhar fixo no que o circunda, nunca se esquece a si mesmo. Vigilante como um polícia. Quando o amor de si mesmo se torna excessivo requer oferecer-se. E esta superabundância de vida faz-nos esquecer de nós mesmos, faz-nos perder, na tensão do entusiasmo, a conta. Mas o esquecimento de si é o desejo de um mundo em que valha a pena perder-se, de um mundo que mereça o nosso esquecimento. E é por isto que o mundo está assim, administrado por carcereiros e contabilistas, está destruído — para arranjar espaço para o dispêndio de nós mesmos. A insurreição começa aqui. Superar o cálculo, não pela carência, como recomenda aquele humanitarismo prudente, prudente, mas que acaba sempre por aliar-se ao carrasco, mas sim pelo excesso. Aqui acaba a política.


A política é a arte do controle. Para que a atividade humana não se liberte dos grilhões do dever e do trabalho revelando-se em todo o seu potencial. Para que os trabalhadores não se encontrem como indivíduos e cessem de se deixar explorar. Para que os estudantes não decidam destruir as escolas para que possam escolher como, quando e o que aprender. Para que os familiares não se apaixonem e deixem de ser pequenos servidores de um pequeno estado. Para que as crianças não sejam outra coisa que cópias imperfeitas dos adultos. Para que a distinção entre (anarquistas) bons e (anarquistas) maus não seja apagada. Para que não sejam os indivíduos os que se relacionem mas sim as mercadorias. Para que não se desobedeça à autoridade. Para que, se alguém atacar a estrutura da exploração do estado, outros se apressem a dizer, “isto não é obra de camaradas”. Para que os bancos, os tribunais e os quartéis não vão pelos ares. Em suma, para que a vida não se manifeste.


A política é a arte da recuperação. A maneira mais eficaz de desencorajar qualquer rebelião, qualquer desejo de uma mudança real, é apresentar um homem de estado como subversivo, ou melhor ainda, transformar um subversivo num homem de estado. Nem todos os homens de estado são pagos pelo governo. Há funcionários que não se encontram no parlamento nem sequer nas divisões adjacentes. Antes, frequentam os centros sociais e conhecem razoavelmente as principais teses revolucionárias. Dissertam sobre o potencial libertador da tecnologia; teorizam sobre esferas públicas não-estatais e sobre a superação do sujeito. A realidade — sabem-no bem — é sempre mais complexa do que qualquer acção. Assim, se aspiram a uma teoria total é apenas para a esquecer totalmente na vida quotidiana. O poder precisa deles porque — como eles próprios nos explicam — quando ninguém o critica, o próprio poder se critica a si mesmo.


A política é a arte da repressão. De qualquer um que não separa os momentos da sua vida e quer mudar as condições existentes a partir da totalidade dos seus desejos. De qualquer um que queira incendiar a passividade, a contemplação e a delegação. Daqueles que não se deixam suplantar por qualquer organização ou imobilizar por qualquer programa. De qualquer um que queira relações directas entre os indivíduos e faça da diferença o próprio espaço da igualdade. De qualquer um que não tenha nenhum nós sobre o qual jurar. De qualquer um que perturbe a ordem da espera pois quer insurgir-se imediatamente, e não amanhã ou depois de amanhã. De qualquer um que se dê sem contrapartidas e se esqueça de si por excesso. De qualquer um que defenda os próprios camaradas com amor e determinação. De qualquer um que ofereça aos recuperadores uma só possibilidade: a de desaparecerem. De qualquer um que recuse tomar lugar nas inúmeras hostes de espertalhões e anestesiados. De qualquer um que não queira nem governar nem controlar. De qualquer um que queira transformar o futuro numa fascinante aventura.

“Il Pugnale”, Maio de 1996
[1] Nota do tradutor: Si refere-se simultaneamente: ao eu, deles, dos anestesiados, ou seja, eles próprios; e a sim, que em italiano coincidem numa só palavra.

Retirado e adaptado da Velha Toupeira.

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quarta-feira, 2 de março de 2011

Como ainda me surpreende a poesia.

Na noite

percebe a noite
o que me anoiteço
escuro de vida
turbulência

Escuto estrelas
e nem apaixonado estou.
ou mesmo se sim
não é este o caso

Pois as estrelas
vibrando no palco negro
sinto os pedaços
da outra parte
meu inteiro

Fico impróprio
por querer
cá ser o diferente

Qual diferença faz?

A minha

Dum menos
de onde menos espero.
A menos que já tivesse esperado
demais duma vírgula

E que vírgula
que descrevo
nos versos
e nas coisas que vejo
cá estou
com certeza estou.

AMC

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sábado, 12 de fevereiro de 2011

Da inutilidade do pessimismo (?)

por Jorge Valadas

Consta que o surrealista Louis Scutenaire teria dito um dia, “Pessimistas, mas que esperavam vocês ? ».

Os que, como eu, nasceram depois da segunda guerra mondial, nada esperavamos e muito já vivemos. Um deslumbramento de acontecimentos históricos ! Foi o fim do colonialismo clássico, as revoltas dos anos 1960, o fim dos totalitarismos da Europa do sul (com um luminoso suplemento subversivo neste Portugal hoje tão cinzento), as revoltas da Europa de leste e o desmoronar do capitalismo de Estado, a transformação do capitalismo de Estado chinês num agressivo capitalismo liberal-burocratico a afogar-se num mar de pobreza, a maior crise do capitalismo depois da dos anos 1920…Como se tanto não bastasse, chegam-nos agora as revoluções do mundo arabe contra os sistemas despóticos locais. Que os sábios de serviço recomendavam como sólidos e adaptados a estes povos resignados por natureza…Tudo isto para dizer que, se eu não estou imunisado contra o pessimismo individual, que faz parte da condição humana, sinto-me totalmente estranho às professias do pessimismo histórico.


Estamos de novo no tempo da História. Que esta a ser feita por milhões de anónimos que se cansaram de esperar por chefes providenciais, personalidades, especialistas, programas, partidos e outras bugigangas de feira política. Que tomaram o seu destino em mão própria. Foi assim que os egípcios, que se tinham atribuido a eles próprios a alcunha de « avestruzes adormecidas », derrubaram o muro da resignação. Situação paradoxal que se pode reproduzir em muitos outros lugares onde o povo vai sobrevivendo em estado de coma prolongado. O mar calmo precede sempre a tempestade. Tudo isto provando, uma vez mais, que por todo o lado onde reina a injustiça social o imprevisivel é sempre provável. E é o imprevisivel que abre a porta à História e torna o provável possível.

As revoluções na Tunísia e no Egípto vieram pois atrapalhar a política e os políticos. O governo israelita, o Hamas , o governo palestiniano, a burguesia vermelha de Pekin, os governos europeus e americanos, o palhaço Qaddafi, todos entraram em pânico face ao imprevisível, ao impensável concretisado ; o derrube de ditaduras sanguinárias que constituíam, finalmente, a maior segurança para todos eles. A paz do horror que é a condição do business as usual.


Estas revoluções vieram também desvendar o mistério do islamismo integrista. A sua inesperada baixa de credibilidade neste período crucial de crise do capitalismo. Trata-se de algo de fundamental que estava provavelmente em gestação de há anos a esta parte, que vai obrigar a rever as « verdades científicas» que nos eram servidas sobre estas sociedades. Na Tunísia como no Egípto, os grupos religiosos estiveram ausentes no início dos movimentos, só entraram neles quando outra coisa nao podiam ja fazer. Todos os testemunhos directos o confirmam. Na Tunísia, o essencial da burocracia religiosa estava mesmo comprometida com a ditadura. Se o islão político não desapareceu – e ele será sém duvida um actor importante nos regimes de “salvação nacional” que vão tentar de se instalar para salvar o sistema -, hoje é o modelo turco que aparece como atractivo e viável e não mais o modelo iraniano. O qual, após décadas de prática autoritária , deu há luz uma monstruosa desigualdade social e um capitalismo de Estado dominado pelos mollahs. Ironicamente, são os poderes ocidentais que antes utilizaram o medo do « estremismo islamico » que se agitam hoje para revalorisar estas correntes. E é sem complexos que o chef da polícia Suliman acolhe hoje no palacio do Cairo as vitimas queele próprio torturou ontém. Os movimentos sociais actuais mostram claramente que as correntes religiosas fazem parte da política clássica, e que, como tal, eles perderam muito da sua credibilidade num momento onde a crise capitalista agrava as condições de sobrevivência do povo. E onde o espaço do reformismo, mesmo religioso, desapareceu.


Embora estas sociedades estejam ainda a viver os primeiros balbuciamentos da questão social, não deixa de ser significativo que ela apareça como central na dinâmica dos movimentos. Na Tunísia como no Egípto as revoluções actuais não caíram do céu. Elas foram precedidas por meses e anos de fortes lutas sociais e de greves, brutalmente reprimidas pelo poder político. E foi a importancia da questão social que fez passar para um segundo plano o projecto político dos grupos religiosos. No Egipto, os acontecimentos vão acelerar-se justamente a partir do momento em que a gréve geral começa a generalisar-se, no dia 10 de fevereiro. A mobilisação de dezenas de milhares de operário(a)s do textil de Mahalla (onde a grande revolta de 2008 foi reprimida no sangue) e das industrias de Port-Saïd, o ataque ao comissariado central da polícia de Port-Saïd pelos pobres vindos dos « ashwayet » (bairros da lata), são acontecimentos que exprimem um salto qualitativo do movimento e pesam mais na balança do que as declarações de El-Baradei à CNN. Também na Tunísia foram os proletários das regiões mineiras do sudoeste, de Gafsa, que constituiram o eixo da insurreição, são eles que continuam a manter a pressão e a defender as revendicações de justiça social. Limitando assim os desejos de compromisso da burocracia sindical e dos chefes da esquerda estalinista local, dispostos a partilhar o poder com os precedentes dirigentes. Enfim, esta mistura explosiva de desejo de emancipação social, de aspirações a uma liberdade humana , foi sem dúvida reforçada pela fusão no movimento de dois sectores da juventude, a juventude pobre de sempre e a juventude « educada », empobrecida antes mesmo de poder ser explorada. Fusão da qual nasceu um potente movimento de auto-organisação basista e de espírito igualitário que ninguém teria imaginado como possivel nestas sociedades. Da qual a praça Tahrir do Cairo ficara como símbolo.


A História não é a politica. Ela é o contrário da política e o regresso à política significará necessariamente o regresso à história domesticada. Em momentos como este, em que a História se impõe, a política aparece na sua verdadeira dimensão, insignificante e separada da vida das sociedades e dos indivíduos. Mas o regresso à História é também a negação da economia e dos seus conceitos. Até há poucas semanas o Egípto era apresentado como um caso exemplar do que os economistas chamam sem rir « os países emergentes ». Bastaram duas semanas de revolução para que os 6% de taxa de crescimento perderam-se nos afrontamentos da Praça Tahrir, deixando visíveis os quarenta milhões de pobres (metade da população) que vive com 2 dollars por dia. Adeus sucesso económico…


O tempo do capitalismo é o tempo da política, o tempo da alienação e da morte lenta. Contra este tempo, ao qual nos vamos habituando, só existe um outro tempo. Que é raro e precioso, que nos faz regressar à Vida e à humanidade : o tempo da revolução. Prever o desenrolar futuro das revoluções na Tunísia e no Egípto, no conjunto do mundo arabe, é tarefa improvável. A capacidade do sistema mondial do capitalismo a restabelecer uma ordem nova que perpetue os fundamentos do velho sistema não pode ser posta em dúvida. Mas a dignidade colectiva que foi reapropriada por milhões de explorados e oprimidos neste movimento colectivo único, contém também uma força. Que é dificil de medir, que não pode ser medida na mesma escala que a força dos opressores. Que têm outras potencialidades, animada por um vector revolucionário que é a perca do medo. O que se passou até agora foi já enorme e traz consequências incomensuraveis. Em parte, e na medida em que tais comparações têm algum sentido, os acontecimentos actuais são comparaveis à queda do muro de Berlin. Eles abrem uma nova época. As consequências para o resto do mundo arabe, para todas as sociedades esmagadas pela arrogância da força são impossíveis de calcular. Mas serão enormes, vão alterar as relações de poder e de força entre os Estados e os povos. O burguesia vermelha chinesa, velha conhecedora do governo pela força, bém o sabe e já deu sinais evidentes de inquietação.
 
PS : Três endereços para continuar a acompanhar e a refletir sobre as revoluções na Tunísia e no Egípto. En francês, www.juralibertaire.over-blog.com/ , documentos, testemunhos e reflexões ; em inglês, dois blogs, www.occupiedlondon.org/cairo/, www.arabawy.org/blog/, um blog do Egípto.


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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Não temos tempo a perder...

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sábado, 22 de janeiro de 2011

Philip Larkin - This Be The Verse wrote:

They fuck you up, your mum and dad.
They may not mean to, but they do.
They fill you with the faults they had
And add some extra, just for you.
But they were fucked up in their turn
By fools in old-style hats and coats,
Who half the time were soppy-stern
And half at one another's throats.
Man hands on misery to man.
It deepens like a coastal shelf.
Get out as early as you can,
And don't have any kids yourself.

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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Luta de classes na Tunísia

Uma onda massiva de tumultos criados por pessoas comuns contra o governo arrebataram a Tunísia nas últimas três semanas sob um boicote quase absoluto da mídia ocidental. Observamos o que vêem acontecendo e porque isso está sendo mantido fora das nossas televisões.

No dia 18 de Dezembro, a polícia Tunísiana abordou Mohamed Bouazis, um graduando universitário desempregado, e confiscou o carrinho de mão de frutas e vegetais que ele estava vendendo para se sustentar e à sua família. Enfurecido pela injustiça e desesperando de conseguir escapar da destituição e fome prevalecentes na economia empobrecida da Tunísia, cada vez mais assolada pelo aumento dos preços da comida, o jovem homem se incendiou em protesto na frente da prefeitura de Sidi Bouzid, 200km de distância da capital Tunis. O jovem morreu logo depois no hospital.


Enraivecidos pelo incidente, centenas de jovens locais que sofriam da mesma forma do desemprego e da repressão pela polícia e pelo Estado do regime ditatorial Tunisiano se juntaram para protestar contra o acontecido. A polícia local respondeu com gás lacrimogênio e violência. Deste então, tumultos massivos e confrontos violentos com a polícia abalaram o país nas últimas três semanas. Em Kesserine, outra cidade do interior, longe da industrial turística da região litorânea, o número de mortos estimado pelos médicos locais e funcionários de hospital passou de 50 no último fim de semana apenas.


Mas a selvageria da guerra civil que irrompeu entre o povo da Tunísia, desde a juventude desempregada, estudantes escolares e universitários, sindicalistas, artistas, intelectuais e mesmo advogados, contra a camarilha corrupta que se reúne em volta do ditador (em tudo, exceto nome), o Presidente Zine El Abidine Ben Ali, pode muito bem não estar acontecendo até onde as grades de notícia da RTE, BBC e o resto da mídia ocidental se preocupam. Comentadores na Al Jazeera e outros meios de comunicação arábes vem apontado amargamente a hipocrisia da mídia ocidental que mostrou a resistência do movimento verde iraniano à corrupção eleitoral de Ahmedi Nejad nas últimas eleições em todos os jornais noturnos, mas está agora censurando a maior história no mundo Arábe atualmente. Será porque o regime de bem Ali é “um amigo do Ocidente”? O muro de silêncio imposto pela nossa “corajosamente independente e imparcial” mídia é significativo.

Enquanto isso, no mundo Arábe, desde o Egito até a Syria, bloggers e observadores comuns estão tomados por entusiasmo pelo que estão chamando da Intifada Tunisiana. A experiência de ser espremido entre regimes corruptos, ditatoriais e repressivos e aumento dos preços da comida é comum à maioria das pessoas na região. Apesar do governo Tunisiano ter fechado jornais da opsição e prendido e torturado jornalistas que ousaram cobrir a luta, a cobertura ainda está passando através do Twitter (siga #sidibouzid), apesar do Facebook ter se dobrado para ajudar o regime de bem Ali (e seus aliados da CIA) retirando as páginas de qualquer jornalista ou Tunisiano comum cobrindo a história.


A intifada ainda está acontecendo, e ontem ela alcançou os subúrbios da capital Tunis, e tropas foram utilizadas nas ruas pela primeira vez. Bem Ali ostensivamente tentou dar sinais de mudança demitindo seu ministro do interior e prometendo que ele irá começar um programa para criar 300.000 empregos nos próximos dois anos. Mas membros de sua família foram vistos fugindo do país.
Vitória e liberdade para os trabalhadores Tunisianos! Abaixo a ditadura de Ben Ali!

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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Que espetáculo de vida!

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domingo, 2 de janeiro de 2011

O real significado do comunismo - por Luther Blisset

 Prelúdio
 
Escrevi um texto, assim meio espontâneo.

I.

O comunismo foi historicamente confundido com as sociedades de capitalismo de Estado do leste europeu e adjacências. Tais formações foram interpretadas tanto por liberais quanto por esquerdistas, como sendo o auge do marxismo e teriam a ver, segundo a mesma interpretação, com a realização prática da teoria marxista. O significado do comunismo acabou sendo absorvido por tais regimes, que se arrogavam a cada dia de sua existência como sendo a única e possível realidade do socialismo.

II.

O objetivo deste artigo não é fortalecer o cinismo dos capachos do capitalismo globalizado; trata-se, antes, de reverter esta confusão e de esclarecer de uma vez por todas a natureza e o conteúdo do comunismo.

III.

As formações do “socialismo real” nada tinham a ver com o comunismo. Na verdade, se aproximavam mais de um capitalismo de Estado do que de qualquer outra coisa. Primeiro, pelo fato que o comunismo pressupõe a não-existência do Estado, ao passo que tais sociedades eram centradas na figura do Estado. Segundo, porque o comunismo não é um capitalismo “melhorado”, onde os operários se apropriam da “mais-valia” que produzem para proveito próprio; o comunismo não é a socialização do capital com uma posterior generalização do status de trabalhador, mas a extinção do capital e do trabalho. 
 
V.

Devíamos nos perguntar, em primeiro lugar: o que define o capitalismo? Afinal de contas, o capitalismo não se define apenas pela oposição entre “proletariado” e “burguesia”, tampouco pela “propriedade privada dos meios de produção”. Na verdade, este se diferencia mais pelo fato de que os meios de produção não são acionados tendo em vista a satisfação de necessidades, mas o lucro em dinheiro, a valorização do capital.

O capital não é o instrumento de produção por si só, menos ainda o trabalho acumulado. Do contrário, poderíamos definir as formigas como sendo capitalistas. O capital é, antes de tudo, uma relação de produção. O que significa isso? Significa que por meio do processo de “metabolismo do homem com a natureza”, as pessoas estabelecem determinadas relações entre si ou formas de se relacionarem mutuamente por mediação das forças produtivas. Mas o capital não é um princípio restrito à “economia”; antes, trata-se de todo um modo de produção e de reprodução da sociedade, de uma relação social total, que diz respeito a todo o conjunto das relações sociais humanas. Assim, o capital é uma relação social que, como resultado, gera a submissão do trabalho vivo ao trabalho morto, do fazer ao feito, do fazer vivo ao fazer objetivado. Trata-se da subordinação do agir humano em geral a um fim estrangeiro, que é estranho ao ator: o fim em si mesmo da acumulação capitalista.

V.

Quando o capital domina no seio da atividade produtiva, surge uma outra esfera, aparentemente oposta, denominada “circulação”. É por onde circulam as mercadorias, pelo viés de onde se realiza o valor ou o mais-valor (“mais-valia”) disposto no ato produtivo. Sobretudo, é o espaço onde as relações sociais entre as pessoas tomam a aparência fetichista de uma relação social entre coisas (entre o meu dinheiro e a sua mercadoria e vice-versa). As relações entre as pessoas e suas atividades ficam condicionadas a ser um mero meio de realizar o “trabalho morto” representado nas mercadorias.  
 
VI.

Partindo de tal análise fundamentalmente crítica da natureza do capital, poderíamos definir o comunismo como sendo a supressão das relações mercantis e da produção de mercadorias, para que o controle dos homens sobre o sentido e o produto de suas atividades seja enfim realizado.

VII.

O comunismo não tem nada a ver com o estabelecimento da “igualdade” entre os indivíduos. Não faz parte de nossos sonhos um tal mundo onde todos comam da mesma comida, compartilhem das mesmas vestes e durmam em lares idênticos. Tais fantasias são a antítese do comunismo!

Menos ainda queremos uma sociedade onde todos ganhem o mesmo salário, sem distinção. O comunismo não é igualdade de salários! Isto seria equivalente à generalização da privação. Antes, o comunismo exige que os indivíduos possam exercer suas diferenças e desenvolver livremente suas potencialidades físicas e intelectuais. No capitalismo, ao contrário, todas as pessoas foram embutidas numa mesma fôrma, independente de seu conteúdo em particular. Em referência ao mercado de trabalho, são todas “mão de obra”, mercadoria força de trabalho; em referência ao Estado, todos contam como sujeitos-voto.

VIII.

As sociedades do leste europeu, bem como Cuba e outros países ditos “socialistas”, não passavam de sociedades de “mercado planificado”. De fato, de acordo com a abordagem de Kurz em “O Colapso da Modernização”, poder-se-ia dizer que os bolcheviques não suprimiram o capitalismo em Rússia, apenas o fizeram introduzir tardiamente. Uma “modernização retardatária” nos moldes do absolutismo.  

IX.
 
Por fim, seria importante ressaltar o caráter dialético da concepção de “comunismo” em Marx. Em “A Ideologia Alemã”, Marx diz em termos claros que:

“Para nós, o comunismo não é um estado que deva ser implantado, nem um ideal a que a realidade deva obedecer. Chamamos comunismo ao movimento real que suprime com o atual estado de coisas”;

Quer-se, desta forma, focar o comunismo não enquanto um “ideal” distante, mas como um elemento presente na própria realidade do capitalismo, como um elo vivo entre o presente e o futuro. O capitalismo não “é”, simplesmente; ele é e existe em constante tensão com aquilo que ele não é. As formas burguesas das relações sociais não estão pronta e devidamente acabadas. Elas não foram estabelecidas num passado longínquo, mas estão sendo estabelecidas, quebradas e re-estabelecidas a todo tempo. Como explica Holloway, as formas burguesas são formações, processos de formação das relações sociais. A forma-Estado, a forma-mercadoria, a forma-capital e assim por diante, são formas maleáveis. Felizmente, não existe um capitalismo “puro” e “total”. No próprio cotidiano das “pessoas comuns”, a crítica do valor se engendra enquanto expressão de uma desarmônica relação entre as necessidades humanas e a economia. À tendência de “ressolidarização” e de reconstituição da comunidade, denominamos comunismo.  

X.

O comunismo é o movimento que age no sentido de suprimir a sujeição do presente ao passado, do trabalho vivo ao trabalho morto, e nesse desenrolar de coisas, tende a extinguir a oposição de classes no seio da sociedade.

Uma vez suprimida a propriedade privada, a oposição entre o “público” e o “privado” e a cisão entre o interesse geral e o interesse particular desaparece. O Estado desmorona como expressão dessa cisão, não para que seja suplantado por uma “democracia direta”, pois a democracia pressupõe a cisão de interesses. Ademais, no comunismo não há uma esfera separada denominada “política” em oposição à uma esfera “econômica”. A vida social opera por meio de um conjunto de relações sociais que não se excluem mutuamente. Enfim, deslumbra-se a comunidade humana.

- FIM -

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